Abel Braga: Mais que um Título Mundial

 

Foto Ricardo Duarte/Internacional

Ainda ecoa na memória do torcedor colorado a tarde de 7 de dezembro de 2025. O ar no Beira-Rio era denso, uma mistura de esperança frágil e pavor paralisante. Em campo, o Internacional lutava pela sobrevivência. Nas arquibancadas, milhares de corações batiam em descompasso, com os olhos no gramado e os ouvidos colados em rádios e celulares, pois a salvação não dependia apenas de uma vitória; era preciso contar com as derrotas de Ceará e Fortaleza em jogos simultâneos. O que é mais difícil: alcançar o topo do mundo ou evitar a queda no abismo? Naquele dia, a história do lendário treinador Abel Braga ofereceu uma resposta definitiva.

A cena era cinematográfica. Um dos maiores clubes do país à beira do segundo rebaixamento de sua história, e no comando, um ícone de 73 anos, que havia deixado a aposentadoria para trás. Abel Braga não voltou para um projeto de longo prazo ou para buscar mais um troféu, mas para uma missão de resgate de apenas dois jogos, atendendo a um chamado desesperado do clube com o qual sua vida se confunde.

O que ele conseguiu foi mais do que uma vitória em campo; foi um feito que, em suas próprias palavras, superou a maior conquista de sua carreira. A perspectiva dele sobre esse momento nos ensina lições valiosas sobre pressão, lealdade, redenção e o que realmente define um legado.

A lição mais impactante da jornada de Abel é contraintuitiva. Ao final da vitória por 3 a 1 sobre o Bragantino, que garantiu a permanência do Internacional na Série A, visivelmente emocionado, ele afirmou que livrar o time do rebaixamento foi mais significativo do que a conquista do Mundial de Clubes de 2006, vencido sobre o poderoso Barcelona.

Sua explicação, direta e poderosa, revela a natureza diferente das pressões envolvidas:

Lá, se eu fosse vice, seria o segundo maior time do mundo. Só que a obrigação era do outro. Hoje foi muito mais importante. Ajudei a salvar o Inter do rebaixamento.

Essa declaração é uma aula sobre a psicologia do esporte. Em 2006, o Inter era o azarão; a obrigação de vencer era do gigante europeu. A vitória seria glória, mas a derrota seria compreensível. Em 2025, a situação era inversa. O peso não era o de "ter que ganhar", mas o de "não poder falhar". Carregar a responsabilidade de evitar a vergonha coletiva, o prejuízo financeiro e uma mancha indelével na história de uma instituição se mostrou uma carga muito mais pesada – e, por isso, seu alívio foi imensuravelmente maior.

Abel Braga estava aposentado como treinador desde 2002. Aos 73 anos, em sua oitava passagem pelo clube, ele não precisava provar mais nada a ninguém. No entanto, quando o clube de sua vida o chamou para o momento mais crítico, ele não hesitou.

Ele não voltou para assinar um contrato milionário ou planejar a próxima temporada. Voltou para uma guerra de 180 minutos. Esse ato transcende o profissionalismo; é uma demonstração de propósito e devoção. É a história de um líder que atende a um chamado por puro senso de dever, colocando a instituição acima de seu conforto pessoal e do descanso que já havia conquistado por direito.

A motivação de Abel Braga não vinha apenas do amor pelo clube, mas também de uma ferida pessoal. Ele revelou que se sentia em "dívida" com o Internacional. Em 2016, ano do primeiro e traumático rebaixamento, ele recebeu um convite para assumir o time, mas, na ocasião, não aceitou.

Essa memória transformou a missão de 2025 em algo muito mais profundo. Não era apenas um trabalho; era uma chance de redenção. A oportunidade de corrigir o que ele sentia como uma falha pessoal serviu como um combustível emocional poderoso. Seu retorno não foi apenas para salvar o clube, mas para curar uma ferida compartilhada com milhões de torcedores que também se sentiram abandonados em 2016. Seu sucesso não apenas salvou o Inter, mas também quitou essa dívida simbólica, trazendo um fechamento para um capítulo doloroso.

Em um esporte movido por cifras astronômicas, o gesto final de Abel Braga é o que cimenta seu status de lenda. Enquanto a diretoria fazia contas para um prejuízo projetado de R$ 145 milhões em caso de rebaixamento, Abel tinha uma contabilidade diferente: a da honra. Após a demissão do técnico anterior, ele aceitou o cargo sem receber pagamento.

Ele assumiu a missão "de graça". Esse gesto altruísta, em meio a um cenário de enorme pressão financeira e esportiva, é o testemunho final de sua lealdade. Sua motivação não era o ganho financeiro, mas sim o legado, a honra e o amor incondicional pelo escudo colorado. Ele colocou sua reputação em risco por princípio, provando que certos valores ainda são mais importantes que qualquer contrato.

A história de Abel Braga e o salvamento do Internacional em 2025 é muito mais do que um drama esportivo. É uma poderosa lição sobre o que realmente constitui um legado. Mostra que o verdadeiro valor de uma pessoa não é medido apenas por troféus e vitórias, mas pela coragem de assumir responsabilidades nos momentos mais sombrios, pela lealdade inabalável e pelo impacto que se deixa em uma instituição.

A glória de ser campeão do mundo é imensa, mas a honra de salvar a casa do desastre pode ser, no fim das contas, a maior vitória de todas.

Em nossas próprias vidas, quais são as "vitórias" que realmente definem quem somos?

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O CONTEÚDO NO TEXTO ACIMA REFLETE O PENSAMENTO DO ESCRITOR E NÃO DO BARCOLORADO!

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